terça-feira, 22 de março de 2011

o dia em que todas as Martas deram as mãos



podia ter sido um dia como outro qualquer. acontece que os dias agora nunca são mais do mesmo. assim ... como qualquer dia, foi um dia especial. vi-me então. estava deitada no chão. mal me vi porque estava quase transparente, era uma mulher fantasma que reconheci. era o eu de então. peguei-lhe na mão e disse: "acredito em ti...acreditas em mim?..então dá-me a tua mão e vamos voar", olhou-me com o que lhe restava de um olhar quase morto e deixou-se levar. abracei-a, mimei-a, acarinhei-a, peguei nela ao colo e lá fomos.

nesse dia estava cansanda de não entender as pessoas que se queixam muito. descobri que tenho um limite de sociabilização. ultrapassado esse limite, desligo e fico ali . . . ausente. isso acontece-me quando não quero participar nos queixumes dos demais, no dizer porque é o que se diz, no seguir a moda do choradinho da crise, no consentir da desmotivação generalizada, e nas doenças??!! puffttt..é incrível: porque falam tanto as pessoas das suas dores nas costas, na tosse, nas suas dores de cabeça intermináveis, será qe ficam melhor ao falarem? ou é como aquela coisa de se falar do tempo porque não se tem mais nada para dizer!? mas o mais incrível é que todos participam, e medem as suas dores uns com os outros...é no mínimo um fenómeno curioso mas... epá..calem-se!!!????...não me chateiem com histórias para não dormir, porque noites sem dormir já tive muitas, e de nada me valeram a não ser isso: noites sem dormir...mais nada!

e numa mesa em que todos participavam num lacrimejar de palavras, alguém me disse que fazer o que não se gosta tem destas coisas..."fazer o que não se gosta??!!! o que é isso?" - perguntei...o silêncio que se sentiu na mesa foi deliciosamente constrangedor!! e eu ria por dentro, gargalhadas sussurradas pelo que já não tenho em mim, porque o aceitei, assim como aceitei tudo o que tiver que fazer...e se não gosto aprendo a gostar...nada mais.

foi então que todas as Martas deram as mãos e sairam a voar pela janela. e cantaram. cantavam num grito tão mudo que toda aquela gente à volta da mesa se silênciou...por fim

sábado, 19 de março de 2011

até amanhã




Desde que acordei que sinto vontade de pintar. mas como não consegui fui pintando de cabeça. Estou com as pessoas, mas não me dou completa, porque na minha cabeça viajam cores formas texturas e brilhos. é um ruído agradável, assim não desejo o silêncio porque este é um ruído de vida.


Olhava aquela boa gente, tentava comunicar, como me era possível, dei-me o máximo que pude, e via-os nos meus contos de cabeça, contava histórias em silêncio com cada um deles, e as crianças eram felizes em cima de póneis roxos de crinas laranjas, e riam riam riam!


Estivemos numa casa grande com paredes, demasiadas paredes. e apetecia-me Sol, aquele Sol que me chamava da janela. continuei naquela casa e depois apetecia-me lua, aquela lua assumida, tao cheia que transbordava. e sentia-me como ela, a transbordar. estou tão cheia de tudo de tanto, como não me lembro de ter estado nunca.


Apeteceu-me tanto aquele Sol e aquela Lua, e estar com todos os meus eus a pintar. mas...ali fiquei. ainda me é dificil agir com me dá na real gana. várias vezes pensei fazê-lo, mas ali fiquei, porque me parecia o mais correcto...bhaaaaa...o mais correcto!!!??? o mais correcto era sair dali a gritar a vida, e correr para abraçar o Sol no fim do mundo, procurar o arco-iris, e ali ficar à espera da srª Lua, sentar-me numa pedra quente e meter as mãos na terra, cheirar flores, cantar com os pássaros e ouvir as histórias que têm para me contar, falar de mim. tenho saudades de falar comigo assim. o mais correcto será sempre sonhar em todos os momentos e nos momentos seguintes, o mais correcto é gritar baixinho que estou apaixonada e nem sei pelo quê, o mais correcto é sentir, sentir-me, só.


mas ali fiquei, a contar histórias de cabeça e pintar sem tintas. e aquelas paredes,tão...paredes.


quando o amanhã de amanhã for um agora, vou fazer o mais correcto, e sonhar, sonhar muito, pegar nas telas e falar-lhes da minha paixão, gritar a vida, abraçar o Sol e esperar a Lua.


até amanhã

sexta-feira, 11 de março de 2011

no outro lado do mundo


hoje houve um tsunami no Japão. Enquanto do outro lado deste mundo milhares de seres perdiam as suas vidas, lembrei-me das palavras de um amigo 'cada dia que vives é um bónus'. E é.

Tenho vontade de arriscar. estou cansada do branco e preto, do é assim porque tem que ser, do fazer racionalizado, do conforto do que se tem e do desconforto do que não se tem e se quer ter.

hoje ía para uma ilha desconhecida sem pestanejar, arrancaria do meu coração tanta razão e arriscaria tudo por um encontro verdadeiro comigo. olhar-me na cara e apresentar-me a mim. Ver-me em todos os lados, reflectida em tudo, marta em todas as partes. dar-me um abraço a sorrir. pegava em mim e íamos de mão dadas num navio rumo ao que fosse que lá estivesse para nós.

chegaríamos a um sitio bonito, porque nós assim o queríamos. as pessoas de lá não falavam a nossa lingua, nem nós a delas. só se podia comunicar com o coração, só o que se sentisse era perceptivel. abandonávamos as palavras e falávamos em silêncio uns com os outros. estaríamos felizes, porque nós assim o queriamos. é assim que acontece quando se comunica com o coração e com o toque.

nesse sitio cheira a fruta e a terra molhada. o céu é violeta e o mar é cor-de-rosa. não há animais abandonados, porque não pertencem a niguém e pertecem a todos. as árvores falam conosco e o vento dá-nos abraços. não se sente frio nem calor. as lágrimas sabem a açucar porque se aceita a dor e toda a gente se olha nos olhos porque não há vergonha nem culpa. fala-se então com o coração.

hoje embarcava comigo.

segunda-feira, 7 de março de 2011

contacto comigo

nem sempre consigo esta proeza mas hoje entrei em contacto comigo. e gostei.
passo tantos dias em que nem dou por mim, ou não quero esse encontro de maneira nenhuma, mas há dias como o de hoje em que me vejo em tudo o que me é exterior e tudo o que me é interior. por vezes custa, mas a verdade é que é bom, porque mesmo o que não se gosta em nós, completa-nos e faz-nos ser mais humanos, sempre e quando se tome consciência do EU.

domingo, 6 de março de 2011

a calma do caos





chamei-lhe 'a calma do Caos'. Está já muito distante o dia em que a senti terminada. Marca uma transição. Passámos tantas horas juntas, mais de um ano parece-me. Tem tanto de mim. Nunca a tinha engradado até ontem. Decidi mostrá-la. Montei as madeiras, num ritual que adoro e me completa. molhei-a com água para amolecer, e levantei-a à sua dignidade. tratei-a bem, com mimos de cola e pintinhas de verniz delicadamente colocadas, retoquei-a, restaurei-a, cobicei-a, abracei-a e amo-a.
Esta pintura sou eu. é Marta ao infinito.
Vai sair à rua. E tenho medo, não da opinião dos outros, isso em nada me aflige. Tenho medo de mim, da saudade que sinto quando olho para ela, do sofrimento e da dor que teimava em tapar em goles largos e amargos. da saudade de estar assim. medo profundo de acreditar que preciso desse sofrimento sem nexo para que de dentro de mim surjam tais imagens. porque quando a vejo acredito que há beleza no sofrimento. uma beleza sinistra que me atrai.
é tão estranho, porque o certo é que nunca senti tanto o sofrimento como agora, aliás nunca senti nada como o tamanho dos agoras. nunca...nada... mas não vejo sentido neste sofrimento, sofro porque sim, dói-me porque sim. e as imagens não são as mesmas, não as vejo tão belas. e isso assusta-me. o mais genuíno que consigo identificar, é esta saudade do que conheço de mim, e que luto em todos os momentos por não concretizar. e ... estou cansada. isto não devia ser uma luta. essa 'calma do Caos' não a quero mais, não posso querer, mas há momentos Deus meu, que desejo tanto voltar a ela e esquecer-me de mim...sair de mim, pedir-lhe que me tire de mim, embebedar-me de tintas, panos e dor. este desejo é o único que verdadeiramente me assusta, porque sei-o eu. O que de mim não sei é...tudo. e estou cansada.
Custa tanto ver-me com estes olhos tão sóbrios, é demasiada consciência de mim. por vezes não gosto do que vejo, e queria não ver, não sentir, não estar, não ser.
Mas quando olho para essa pintura vejo também vitória, vejo um passado, uma vida onde me vejo possuída por uma sombra do que sei que posso ser. uma sombra afinal era o que eu era.
vi-me hoje como um cacto: um dia fui a Malta, e apanhei na rua um pedaço de um cacto que achei lindo. Esteve num saco de plástico uns meses e um dia meti-o, já meio seco, no canteiro abandonado do meu quarto de criança. os anos passaram, e não é que o raio do pedaço de cacto pegou naquela terra morta??!!! é impressionante! hoje estou aqui nesse quarto, onde volto sem saber o que sinto, nem porque o sinto, abri a janela e lá estava ele. Está enorme, lindo e cheio de vida... como é possível?? esse cacto teve que morrer para voltar a nascer. adoro-o...é um sobrevivente, e merece todo o meu respeito e admiração.
hoje vi-me num cacto. vi que aquela 'calma do Caos' me fez morrer para renascer. e vi que a dor que sinto agora é uma dor de vida. doi porque sim! porque estou cá e sinto.

quarta-feira, 2 de março de 2011

Estava então a falar com o rio. Perguntei-lhe: 'Tejo, como consegues estar sempre a correr?' e ele respondeu-me: 'é neste movimento que consiste a minha vida...o Sol só nasce porque a Terra gira'

e é mesmo só isto

terça-feira, 1 de março de 2011

era uma vez

No meu universo interior vivem vários mundos, tantas realidades, prazer e tormentas que não entendo. conflitos e caos. doi-me cá dentro. hoje até na barriga sinto esta vazio que não se enche nunca. espero...espero... e doi. só o sonho vale e é verdade.
No meu mundo interior vivem imagens, tantas e tão bonitas. são rios, pássaros de mil cores, amantes, sangue, flores, planetas, terra e cal, gatos que miam muito, há mar, tartarugas centenárias, e elefantes gigantes, há sempre música e ar.
Parece que quem sonha é mais rico, vive melhor, é mais bonito. eu sonho muito, mas sou uma rica rota. pobre. minúscula. mas sonho muito.
Gosto mais de viajar no meu universo interior que na realidade concreta, seja lá o que isso for! parece-me feia quando olho as pessoas na cara e vejo por detrás das palavras politicamente correctas, dos sorrisos compostos, das ideias mais ou menos, do morno das suas almas, da racionalização dos gestos, do desviar do olhar, do opaco dos olhos, da vulneberabilidade escondida, da frieza dos sentires, e do comodismo dos estares, da entrega por compaixão, do dar de mãos conveniente, das rezas repetidas.
Fico desassossegada quando estou com muita gente à volta, muitas cabeças, pouco pensar, demasiadas palavras. as pessoas falam muito, falam demais. porque se fala tanto? nunca entendi...é afinal no que não se diz que está a essencia, é no que se adivinha que vive o interesse, no que fica por dizer, no que fica por viver, no que fica por sentir. o que já se sentiu está morto. o que já se disse, morreu. palavras ditas estão enterradas. calem-se por favor!
Gosto tanto do silêncio. Adoro o meu silêncio quando estou a cantar. estou sempre a cantar, descobri à pouco tempo. foi surpresa. Canto em silêncio, mas ouve-se bem cá dentro. sou afinadinha a cantar. gosto das notas das letras do som e da imagem das minhas músicas. Só as ouve que me entende e me sente. só se ouvem a sentir, não é preciso os ouvidos.
Por vezes tento passar sentires do meu universo interior para o realidade em formas desenhadas, na tentaiva de trazer algo novo ao mundo em que vivo. é só assim que existo. só assim me deixo ver. nessas representações não há máscaras porque não sou eu que mando nos pincéis. eles vivem por si e não sabem o que é o teatro. Ali sou só uma mão, pequenina de criança. Não há palco nem plateias.
Sei que posso pintar tudo, mas não tenho conseguido, e não pinto nada. está tudo cá dentro reprimido, retraído. deve ser por isso que me doi as entranhas. penso que é do vazio, mas deve ser do exesso de imagens que precisam de sair. pedem-me e eu não permitido. não me tenho permitido libertar-me. é neste processo que fujo da dor, é quando trago algo novo à realidade que se me enche um pouco o vazio ... esse. é quando consigo transportar do meu mundo interior as minhas canções que me surgem as respostas.

'era uma vez', gritam cá dentro as imagens e os sonetos, mas hoje a tela é só branca. espera-me. e eu...a que espero?
já sabia que isto ía doer. é sempre assim. e nem as tuas palavras rodeadas de minha surpresa e admiração me tiraram estas borboletas do estomago. nem te consegui olhar nos olhos pois sinto-me suja e indigna. culpada. és o meu conselheiro, que me aconselhas?

não tenho energias para pintar a vida. copiei cerca de 150 paginas dos teus textos, e vou deitar-me e ler-te, a ti minha amiga. é a única coisa que me acalma quando estou assim. que bom ter-te na minha vida, mesmo que seja em forma de texto.
ardem-me os olhinhos.